sexta-feira, 17 de maio de 2013

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Sites colaborativos celebram beleza do corpo feminino fora dos padrões atuais

Cada época tem seu padrão de beleza. Das roliças retratadas nas pinturas da Renascença à magreza quase anoréxica celebrada em passarelas na década de 1990, chegamos hoje a um modelo de mulher de silhueta magra, mas curvilínea; rosto corado; seios fartos e cabelos longos, lisos e aloirados, replicadas em profusão na TV, nas revistas e na publicidade. Quanto mais hegemônico o ideal de beleza, maior o mal estar de quem não se encaixa na imagem. E maiores as chances de surgirem iniciativas de expressão pessoal contra o padrão. É o caso de três projetos colaborativos – ou seja, alimentados por quem está do outro lado da tela – que celebram a variedade das formas femininas.

Nascido no exterior, mas com contribuições do mundo todo, “The Nu Project” retrata mulheres comuns nuas, sem retoques de Photoshop. O “Large Labia Project” faz um recorte ainda mais específico, celebrando a variedade de formatos das vulvas femininas. E o “Shape of a Mother” dá espaço ao corpo feminino real depois da gravidez.

“O corpo da mulher comum é o que a sociedade exige como reação contrária ao abuso do corpo perfeito. As mulheres estão reagindo e a mídia responde a isso”, pondera a historiadora e socióloga Rosana Schwartz. Um exemplo é a campanha “Mulheres Reais” da Dove, de 2004, que incentivou mulheres do mundo todo a se aceitarem e se amarem como são. “Quando a maioria dos consumidores quis ver algo diferente, isso aconteceu”, opina Matt Blum, criador do site The Nu Project.

O fotógrafo americano mantém o projeto ao lado da mulher, Katy Kessler. Matt roda o mundo clicando voluntárias em suas casas. Depois das fotos, nenhuma das imperfeições físicas femininas jamais visíveis em capas de revistas são apagadas das “modelos”: celulites, flacidez e estrias continuam lá. “Digo sempre durante as fotos: ‘você é linda assim’”, diz.

Segundo Matt, ser fotografada nua pode ser uma experiência poderosa e uma maneira de libertação. “Fico muito feliz quando ouço histórias de mulheres que tinham medo que amigos e família vissem as fotos, e depois mandam as imagens para todo mundo. Depois disso, o que elas mais dizem é que se sentem mais confiantes com seus corpos”, comenta. “Pouquíssimas disseram receber um feedback negativo”.

Aparência e libertação

A diversidade também é o mote do Large Labia Project ("Projeto Grandes Lábios"; fotos explícitas), criado pela australiana Emma P., de 24 anos. Depois de assistir a um documentário sobre a censura de vulvas fora do padrão pornô – ou seja, com lábios salientes – em filmes do gênero, ela decidiu criar um espaço para celebrar a variedade de formatos íntimos. “Tomei isso como pessoal, pois tenho lábios maiores, mais escuros, um pouco desiguais no comprimento. Mas perfeitamente normais”, conta.

Para Emma, a pornografia dá uma falsa visão de que as mulheres reais se parecem umas com as outras. Portanto, quando comparam suas vulvas com as que veem na tela, as mulheres podem achar que há algo de errado com elas.

“Feia”, “nojenta”, “estranha”, “anormal” e “repugnante” são algumas das palavras mais usadas pelas leitoras que lhe escrevem descrevendo como veem suas genitálias. “Isso está afetando a autoestima e a vida sexual de muita gente. Algumas mulheres acham que não podem fazer sexo, ou só podem transar no escuro. Outras têm medo de fazer sexo oral. Se elas se odeiam, como podem esperar que alguém as ame?”, questiona.

É justamente para ajudá-las a se amar que Emma atualiza o “Large Labia Project”. Lá, as mulheres podem expressar medos, preocupações e até ódio por seus próprios lábios vaginais, com um desabafo acompanhado de uma foto. O espaço também permite que elas recebam a confirmação de que seus lábios são perfeitamente normais, bonitos e atraentes. Permanecer anônimas lhes dá a liberdade de fazer isso com o mínimo de risco.

Foi este mesmo sentimento que permeou a criação do The Shape of a Mother. Bonnie Crowder, fundadora do site que reúne fotos confessionais do corpo feminino pós-gravidez, observou uma cliente erguendo o carrinho de bebê para passá-lo sobre a mesa em um restaurante na Califórnia. Apesar da boa forma, a mulher tinha o mesmo excesso de pele em volta da barriga que ela. “É muito libertador perceber que você não é a única a ter esta aparência. As mulheres das revistas não se parecem com a maioria das mulheres reais”, ressalta Bonnie.

Querer se parecer com uma modelo de capa de revista pode ser problemático, mas pior ainda é achar que você é a única a não alcançar este padrão. “O maior problema é a mulher que não se parece com a imagem da revista começar a se esconder. Isso a impede de descobrir que ela não está sozinha. É por isso que o SOAM foi fundado: quanto mais corpos virmos, mais variedade de formas acharemos normais e bonitas”.

No Brasil

O conflito entre a busca pelo corpo ideal e a satisfação com a própria imagem estão muito presentes na vida da mulher brasileira. Em “O Corpo como Capital” (Editora das Letras e Cores), a antropóloga Mirian Goldenberg relembra que a brasileira é a mulher mais insatisfeita com seu corpo: só perde para a americana no ranking mundial de cirurgias plásticas e gastos com cosméticos e tratamentos estéticos. “Ela vive nessa busca pela boa forma, pelo corpo jovem, magro e sexy. Se sabe que não vai atingir este modelo ideal, pelo menos se sente estimulada para chegar perto daquilo”.

Para Mirian, sites como “The Nu Project”, “Large Labia Project” e “Shape of a Mother” são propostas libertadoras e convidam ao questionamento, mas a brasileira continua deslumbrada pelas mulheres impecáveis das capas de revistas e novelas.

“Elas gostam de imitar o cabelo da Gisele [Bündchen], mas ficam felizes quando veem que a Juliana Paes também tem um pouco de celulite no bumbum”, explica. “A nossa cultura não é do ‘ou’, e sim do ‘e’”, finaliza. (Tribuna da Bahia)

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